terça-feira, 19 de julho de 2011

110 São Carlos


E em plena segundona, na minha rotina de toda semana, lá ia eu subindo a imensa ladeira do morro São Carlos, rumo ao CRAS... (Claro que ia subindo a imensa ladeira de bus, né?)ônibus esvaziando ao longo do caminho, quando um senhor de idade, bastaaaannnnte avançada, se deslocou passo a passo, cambaleante, com enorme dificuldade, para a porta traseira do coletivo, na intenção de descer. Porém, ele havia puxado apenas a sobra da cordinha - aquele resto de corda que cai após a última cadeira, sabe? O que também só fui saber depois - e, por esta razão, nem o motorista, nem o trocador, nem ninguém pôde ouvi-lo e o ônibus não parou. Mas o senhor, apesar disso, prosseguiu e estacionou-se num degrau colado à porta, ignorando os enormes riscos a que estava se submentendo. Fiz um gesto para ele, tipo: "Ei, senhor, cuidado aí!! É perigoso!!". Mas ele nem me deu idéia e resmungou qualquer coisa.

Um outro passageiro tentou assessorá-lo, iniciou uma conversa - só ouvi murmúrios - mas como me pareceu bastante dedicado larguei o assunto e virei para a frente. No entanto, a assessoria foi sumariamente rejeitada pelo senhorzinho, que ainda não havia percebido que o ponto onde ele pretendia descer já tinha ficado para trás há "horas". Quando ele se deu conta do ocorrido, tentou gritar, com sua voz fraquinha e falha; parecia mais um gemido. Os poucos passageiros que estavam dentro do ônibus pensaram que ele estava passando mal e o sufocaram com tantas perguntas. Pediram para o motorista parar. O motorista desacelerou como se fosse parar, mas aí alguém, que havia resolvido ser o porta-voz do senhor, disse que era para prosseguir, que ele desceria mais adiante. No entanto, esta foi uma equivocada interpretação, pois o senhor manteve-se no degrau que estava antes, ignorando todo o movimento dos passageiros dentro do ônibus, fazendo menção de descer a qualquer momento.

Um pouco mais a frente o motorista parou, para que outro passageiro pudesse subir. Pronto, deu-se a desgraça!! O senhorzinho ficou preso na porta, grunindo!! Foi um Deus-nos-acuda!! "Páre o ônibus, motorista!!! Páre o ônibus!!" Todos gritavam em defesa do senhor!!

Quando, enfim, o senhor se acalmou e todos entenderam o que havia acontecido, ou seja, que ele havia perdido o ponto há muitos metros atrás, porque tinha puxado a parte final da cordinha - aquela que não faz tocar a campainha - o motorista quis lhe dar uma dica de como voltar.

Quando o senhor saiu do degrau, parecia que o desfecho seria feliz, com moral da história e tudo o mais. No entanto, ele caminhou em direção ao motorista, disse meia dúzia de palavras inaudíveis que terminaram em: "A cordinha está curta!! Está curta!!" e simplesmente se sentou.

Affff

segunda-feira, 4 de julho de 2011

"Humano, demasiadamente, humano"

(escrito, exatamente, há um ano)


Gostaria mesmo de sonhar sem limites, desavergonhadamente, sem parar para pensar se o sonho poderia de algum modo se tornar realidade. Afinal, o que é real? Mas nunca conseguiremos sonhar para além da nossa realidade. Nossos sonhos são a medida do que experimentamos ou conhecemos. Como são pobres nossos sonhos! Nossa imaginação é tão estreita! Gostaria de imaginar o inimaginável, aquilo que nem sei se existe! Algo que esteja além dos meus domínios, dos meus desejos, dos meus sonhos mais escabrosos... Da minha vida e identidade! Queria me entregar às asas de uma imaginação mutante, que se transformasse a cada instante, me impedindo de criar algo que fosse lógico ou possível. Queria que minha imaginação me levasse embora, me fizesse viajar e nesta viagem me fizesse enxergar algo tão óbvio e simples como o amor, mas de um jeito totalmente novo e brilhante, de modo que, ao voltar, eu pudesse me refazer, como uma peça de roupa desconstruída em outra; como reconstruir um sonho a partir de uma outra paleta de cores. Daí, então, teria mais certezas, as certezas de quem já viu algo além do arco-íris, sabe? Mas acho que isso já é minha imaginação prosaica e pobre, sem sentido. Aliás, com sentido, um sentido totalmente humano, o de tentar buscar fora de si, algo que deveria estar dentro. Ou não.

Ahhhhhhhhhhhhhhh cansei!